Sextou!
A sexta-feira era 13. Não sou supersticioso, mas as coisas não começaram bem: acordei com o interfone.
— Quem é? — perguntei sonolento.
— Pô, cara, “tamos” atrasados! O embarque. A reunião de negócios em SP, esqueceu? –Jorge disse.
O frio na coluna me fez despertar e, em três minutos, eu me arrumei. Catei a mochila, que deixei arrumada para dois dias, mordi uma maçã e fui.
— Pediu o Uber? — perguntei para Jorge assim que cheguei ao portão de casa.
— Um minuto para chegar. — ele respondeu e mostrou o celular com apenas 5% de bateria…1% agora. — Lá na esquina… chegou!
Carro branco, placa “K” alguma coisa, o motorista se chama Luiz; ele falava e corria agarrado a sua mochila.
Corri atrás e entramos às pressas. As portas do veículo fechamos “pra sempre”; com nossa respiração ofegante, acomodamos nossos esqueletos jogados no banco de trás com as mochilas.
(Se você, meu amigo leitor, já se atrasou para um compromisso entenderá o nosso desespero).
— Galeão, Luiz, o mais rápido por… tossi e não terminei a frase. Jorge logo se afastou e abriu a janela. O “bom dia”, nem me lembro de ter dito.
Leia também de Jr Pedroza:
– Conto: Lição da Guerra
O motorista, um senhor de meia idade, de estatura mediana, de cabelos grisalhos, nada disse. Estava acompanhado por uma bonita mulher, que aparentava a mesma idade. Achei estranho, nunca vi motorista de aplicativo dirigir acompanhado, mas voltei meus pensamentos para o compromisso e só desejava chegar a tempo.
Jorge e eu estávamos inquietos, apreensivos. O motorista pisou fundo, arrancou com o carro, o pneu cantou silenciando-nos e o barulho atraiu a atenção das pessoas que estavam na rua. A “sinfonia” do motor acelerado me fez ter a esperança de que conseguiríamos. Mas tive medo, confesso, e quem não teria? Queria chegar em São Paulo e não ao céu. Após vinte minutos, Luiz freou bruscamente.
Minha mochila foi parar no para-brisa e, por eu estar sem o cinto de segurança, abracei o banco do carona para não ir junto. O condutor desceu com as mãos para cima em direção à viatura de polícia e, aos prantos, gritou:
— Minha mulher e eu fomos sequestrados por dois meliantes. Ela está no carro com eles.
Tateei o banco e o chão do carro em busca dos meus óculos que perdi na frenagem. A única coisa que consegui ver foi o Jorge todo despenteado à procura de seu celular descarregado. Já o meu, na correria, esqueci em casa.
Em seguida, ouço:
— É a polícia, saiam do veículo e coloquem as mãos para cima!
O “abençoado” do Luiz acrescenta:
— Eles estão armados e são perigosos.
A dupla enrolada desce.
— Qual o seu nome? — o policial indagou meu amigo enquanto nossos rostos “massageavam” a lataria do carro do danado Luiz.
Jorge, com os olhos arregalados, só conseguia dizer: –Jor…Jor. ..Jor…Jor.
Fomos algemados e ele não chegava ao “ge”. Eu não aguentei e ri, porque a situação o deixou gago. Então fui “carinhosamente” interpelado pela autoridade:
— Está rindo de quê, estrupício?
Inteligentemente, engoli o riso. A delegacia nos abrigou por três dias até entenderem a confusão.
Seu Luiz só veio deixar a esposa na casa da tia e não era motorista de aplicativo. As características de seu carro eram bem próximas às do carro chamado pelo Jorge e os motoristas ainda eram xarás. Com o telefone descarregado, Jorge não percebeu a confusão e nem visualizou a mensagem: a reunião foi cancelada devido ao início do surto da Covid-19.
Sextamos da “melhor maneira”!
Olhando pelo lado bom, pelo menos não perdemos a reunião!