Crônica: Ela só queria sonhar a dois…

O globo. Imagem: Pinterest.

Written by: Crônicas

Existem poucas certezas na vida e uma delas é que todas as pessoas sonham, em maior ou menor medida.

Existem também aqueles dias em que pensamos que nem deveríamos ter levantado da cama. Mas como isso seria possível se havia mil e uma coisas para fazer?

Esta história até parece um conto de fadas moderno!

Bela acordou num lindo dia de sol, o seu dia começou bem, mas o sentimento estava ali… as chances de que as coisas continuassem bem ao longo do dia cresceram muito. Isso é consequência de termos uma rotina matinal positiva e vencedora ou uma predisposição para ter uma rotina matinal negativa e desordenada.

Sempre com bom humor, após ter terminado suas atividades, Bela resolveu ir ao parque para apreciar as maravilhas que o Senhor Deus criou e aproveitar melhor seu dia, afinal era sábado. O tão esperado sábado!

Eu não sei porquê, mas sábado tem sabor de mel, tem sabor de maçã do amor. Se é que me entendem! E é aí que mora o perigo, a complicação, a insatisfação – temporária ou não – pois ela não se permitia prolongar esses gatilhos emocionais, devastadores, por muito tempo. Até por uma razão prática de fé. É o que ela realmente acredita.

Mas falando bem sério, quem não tem aqueles momentos em que baixa a deprê e que só passa com um filme melodramático e uma panela de brigadeiro? Dizem que chorar alivia. De fato é verdade, mas é verdade também que alivia apenas momentaneamente. Pode ser que na semana ou mês seguinte, a deprê queira novamente nos fazer companhia.

Bela pensou: o que será que causa esse fenômeno em mim, e por que todos os dias não são felizes?

Pobre Bela! Tudo isso ocorrera por causa de uma conversa que ela teve no dia anterior com sua querida amiga e conselheira. Sua mãe substituta de todas as horas.

O papo estava fluindo muito bem. Um tempo proveitoso e produtivo como sempre é. Sempre que ia visitar essa amiga sentia uma energia boa e retornava para casa melhor, pois ela influenciava de forma muito positiva sua vida.

As duas poderiam ficar sentadas no aconchegante sofá por horas conversando e nem viam o dia passar e naquele dia não foi diferente até que, carinhosamente e cheia de boas intenções, a conselheira perguntou:

Quais são seus sonhos no momento?

Bela inconscientemente abriu uma nuvem e pensou: será que ela não se dá conta que para mim não é nada fácil estar com 30 e poucos anos solteira? Que para mim é mais que uma fase complicada? Tendo como companheiro apenas o meu celibato, que para mim é uma tortura e faz eu me sentir quase sem rumo? Vem me perguntar sobre sonhos…

Ah, tenha dó!

Com uma tentativa suicida de encerrar o assunto e com ela a vontade de se enfiar num buraco escuro e só sair dele após ser resgatada pelo bonitão do Brad Pitt, Bela pensou numa resposta prática.

Não satisfeita, a amiga continuou.

Bela, Bela! Eu te fiz uma pergunta…está tudo bem? Ficou pensativa, meio que distante.

Desculpe, disse Bela acanhada. Você dizia…?

E a conselheira de todas as horas incansavelmente repetiu cuidadosamente a pergunta: Quais são os seus sonhos no momento?

Bela, sem saída, resolveu externar sua chateação e disse: No momento eu estou sem sonhos.

Surpreendentemente a conselheira revidou: Como assim, sem sonhos? Não pode ser. Isso nem combina com você.

Com uma velocidade assustadora e com a voz discretamente embargada, sua conselheira disse: Você não quer viajar para Austrália, para conhecer a Grande Barreira de Corais, ou conhecer as Ilhas Virgens Britânicas que tem uma beleza inigualável, águas azuis cristalinas, mergulhos inesquecíveis e um alto-astral contagiante? Ou ainda comprar um apartamento em Boston, ou até mesmo fazer outra faculdade de Psicologia ou Letras, que são suas paixões ou quem sabe fazer um turismo doméstico?

Mapa do mundo. Imagem: Pinterest.

Mapa do mundo. Imagem: Pinterest.

Ela continuou empolgada com mil possibilidades. Isso porque Bela tem um espirito aventureiro e adora conhecer novos lugares e consequentemente fazer novas amizades.

Bela respirou fundo, contou mentalmente até 2517 e corajosamente respondeu:

No momento eu queria sonhar a dois. Queria mesmo era acordar apaixonada porque os apaixonados costumam achar que o mundo é lindo, com cores vivas e sol brilhante. Queria mesmo era sonhar a dois!

 

 

 

E continuou impávida…

Queria reinventar a minha vida, reescrever minha história e torná-la mais interessante e satisfatória para mim. Claro que gostaria! Será que alguém me entende? Eu queria sonhar a dois…sonhar a dois! Sonhar a dois, so-nhar -a- do-is. Ainda preciso repetir?

Noiva no espelho. Imagem: Pinterest.

Noiva no espelho. Imagem: Pinterest.

Com essa resposta ela achou que a conselheira a animaria e pegaria em suas mãos e diria: Uauuu! Vamos colocar esse sonho em ação! (Doce ilusão).

E qual não foi a surpresa de Bela, quando a conselheira levantou freneticamente e abruptamente mudou de assunto!

Como dizia minha amiga do ensino médio: mudando de avião para chiclete.

Sem nenhuma cerimônia e com tamanha “disfarçatez”, a conselheira ofereceu uma xícara de chá e pediu que a ajudasse a preparar um bolo cremoso com uma deliciosa calda de avelã.

Mas o que é isso, que desrespeito horroroso é esse com os meus sentimentos? Se eu tivesse dito que queria aprender grego clássico ou latim arcaico, ela iria elogiar o plano e dizer “Nossa, você arrasa nas escolhas”. Mas como o desejo era outro, ela nem se quer ouviu o que eu disse. Funcionaria se eu gritasse aos quatro ventos com um megafone? Que palhaçada é essa? Qual o problema de querer sonhar a dois? A três, a quatro, a cinco, a seis…a dez?

Pelas barbas do profeta Jeremias!

A conselheira sempre foi muito sensível, já chorou horrores com Bela ouvindo-a contar algumas lamúrias de sua vida. O que teria acontecido para que em algumas horas ela tivesse se tornado a DESTRUIDORA de sonhos? Céus! Socorro!

Bela sempre foi muito bem-humorada e espirituosa. Ela procurava ver o lado bom da vida sempre, tendo aprendido essa lição direitinho com “Pollyana”. Apesar disso, ela também não abria mão de seu senso dramático e exagerado. E vamos combinar: Tudo tem um limite!

Absolutamente certa e convicta da falta de empatia e percepção da conselheira em relação a esse tema “sonhar a dois”, Bela desiste de falar e decide ir embora, tentando esquecer aquela conversa fatídica e tão solitária.

Malas prontas. Imagem: Pinterest.

Malas prontas. Imagem: Pinterest.

Mesmo sendo uma pessoas que desejava conhecer o mundo, a cultura e as artes, isso não anulava o fato dela ser também uma romântica incorrigível e piegas. Todas são no final das contas.

Embora não compreendida pela amiga de todas as horas, não queria desistir dos seus sonhos (ainda que ocupem um plano elevado e inalcançável demais), não queria enterrar aquilo que de alguma maneira a mantinha mais viva do que nunca, porque amar faz isso conosco.

Afinal, tudo o que ela queria era sonhar a dois. E isso ainda não é crime… ou é?

*Texto escrito pela colaboradora Paula Jones.

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Tags:, , , , , , , , Last modified: 19 de março de 2019

Paula Jones (Paula Cincurá) é turismóloga de formação e atualmente cursa pedagogia. Trabalha como professora de Educação Infantil em Itaberaba, na BA. Nos tempos livres gosta de ler, ouvir música e não dispensa um chocolate (acredita no poder terapêutico que ele tem contra o estresse). Instagram @paulasallescincura