Ficaram as boas e velhas lembranças…

Casal. Imagem: Free Pik.

Written by: Coluna

Quem nunca parou num banquinho da praça e se deteve relembrando de algum momento ou situação da vida, ou alguma pessoa com quem se relacionou, que o fez sentir saudade?

***

A história abaixo ilustra um pouco disso…

Talita estava sentada no banco de uma praça perto de sua casa. O dia estava bonito, o sol poente escondido entre as nuvens. À sua frente passava um casal de velhinhos. Pareciam muito felizes. Um suspiro foi inevitável.

Sol é vida e luz. Imagem: Free Pik.

Sol é vida e luz. Imagem: Free Pik.

As nuvens começaram a ficar escuras e densas, alguns sons de relâmpagos ameaçavam chover, mas ela não estava nem um pouco preocupada se ia se molhar ou não.

Pela janela sua irmã a observava e logo percebeu, pelo semblante que ela demonstrava, que a irmã vivia um momento saudoso, presa em algumas reminiscências. Talvez reminiscências que, com toda certeza, agora restavam apenas no plano das boas e velhas lembranças.

O sentimento era ávido. Não queria chorar, mas as lágrimas que achou não ter mais, se fizeram presente, salgando todo o seu ser.

Afinal, Shakespeare tinha mesmo razão: “Todo mundo consegue controlar uma dor, exceto quem a sente”

Talita sentia na pele o amargo desse sentimento e também a doçura de cada momento, de cada abraço, das muitas risadas compartilhadas e algumas tristezas também. O que mais doía para ela, era como sua história foi interrompida sem muitas explicações, com poucas palavras ditas. Foram aqueles momentos suficientes e determinantes para um ponto final.

Houve também um ressentimento por acreditar que houve, sim, pouca luta ou pouco esforço em mantê-la ali. O que desejava era saber e se sentir mais importante para ele; queria que ela fosse o “seu tudo”. Queria que ele tivesse decidido lutar por ela, sem que ela precisasse pedir.

Talita sempre achou que, enquanto existisse amor, a relação até poderia estremecer, mas não o bastante para não se reinventar, se ajustar no que fosse preciso, a fim de seguir adiante.

Contudo, não foi assim. Como tudo que traz prazo de validade na embalagem, o romance acabou.

Rosa seca e triste. Imagem: Free Pik.

Rosa seca e triste. Imagem: Free Pik.

A história dos dois acabou, mas não há como anular o que foi vivido. Não há como condenar ou negar o passado, afinal, ele foi vivido pelos dois. E de alguma maneira, ela foi feliz.

Mesmo após o término do seu relacionamento, Talita nunca parou de pensar em Miguel. Não queria nem por um momento esquecer de cada detalhe ou gesto. A maneira como ele passava a mão no cabelo e o quanto seu olhar dizia tanta coisa, sem dizer uma palavra. Gostava do jeito como ria, ou melhor, do som da sua risada, que era tão gostoso de ouvir. Era leve e debochado, muito peculiar.

Ela carregava também uma preocupação. Na verdade, tinha medo de acordar e já não mais lembrar dos traços que ela tanto admirava nele. Se martirizava porque queria preservá-los em sua mente para sempre. Sim, queria guardá-los no âmago de seu ser.

Ela recordava entre lágrimas, todos os dias que marcaram intensamente sua vida: desde o primeiro olhar, a um “olá” que explodiu dentro dela. Era um sentimento avassalador, e ela viveu cada instante irrevogavelmente.

Tinha saudade do abraço dele. Daquele abraço dele. Tinha certeza de que seu abraço foi feito sob medida para ela.

Uma rajada de vento bagunçou seu cabelo, e em alguns segundos levou as lembranças que a tomavam, que naquele instante estavam mais vivas que qualquer outra coisa. Uma mão no ombro e uma voz calorosa e preocupada a chamando para entrar também fez com que ela finalmente voltasse à realidade e se conformasse com sua história, de um conto de fadas sem final feliz. Na verdade, um conto dramático sem um desfecho resolvido.

***

Pegando carona na história acima, fui buscar significados.

De acordo com o dicionário a palavra “saudade” significa “Sentimento nostálgico provocado pela distância de (algo ou alguém), pela ausência de uma pessoa, coisa e local, ou ocasionado pela vontade de reviver experiências, situações ou momentos já passados”.

Mesmo com uma definição tão explicada e ainda tão bem exemplificada pela história de Talita, só recentemente eu pude compreender a proporção desse sentimento devastador. Vem carregado de emoções, emoções que muitas vezes já estão adormecidas, que ressurgem num ímpeto incontrolável e até escorre pelos olhos.

De todos os sentimentos que tenho na vida, a saudade é a minha mais fiel companheira.

Sinto saudade o tempo todo!

Sinto-a constantemente. Saudade da hora do lanche na escola (que hora mais feliz), saudade do meu melhor amigo da infância. Como eu lembro de você, Jaiminho “meu entregador de cartas preferido” rsrs…

Por onde anda Jaiminho? Imagem: Free Pik.

Por onde anda Jaiminho? Imagem: Free Pik.

Aventuras não faltavam para cada momento que tivemos juntos. Lembro-me de cada travessura que aprontávamos fielmente de segunda a sexta, porque nosso convívio se resumia à escola, já que nos finais de semana estávamos comportadamente com nossas famílias.

Saudades das brincadeiras, do nosso lazer, choros, brigas (que não eram poucas), desilusões, mas principalmente das nossas risadas que eram insubstituíveis.

Saudade desse tempo de criança quando não tínhamos boletos para pagar e a vida se resumia às tarefas da escola e quando muito, arrumar nossa cama.

Saudade do cheiro maravilhoso que tinha o bolo de milho da minha avó. Saudade das amizades que fiz em tão pouco tempo ao morar no Jardim Esperança. Eram poucos, mas verdadeiros.

Bolos da vovó. Imagem: Free Pik.

Bolos da vovó. Imagem: Free Pik.

Também sinto saudade de um grande amor! Devia ter congelado o último abraço. Devia sim! Ele levou tudo de mim e me deixou aqui, abandonada dentro da vida.

A saudade é o amor que fica. Por meio dela acesso todo um passado já vivido e também um futuro que ficou por viver. Sinto raiva de você por me fazer conviver com essa saudade absurda.

Esse sentimento invade corações, tanto de humanos quanto de animais (ainda que apenas por instinto). Verdadeiramente não faz acepção, afinal, quem nuca se emocionou com o filme “Sempre ao seu lado”, do cachorro que fica esperando diariamente pelo seu dono na estação e trem? E ele nunca volta. 🙁

É quando percebemos que nesse universo saudoso ele se torna longo, desesperador, implacável. Quando na verdade muitos dizem que do outro lado ele é ínfimo, passageiro e fugaz. Recuso-me a acreditar nisso!

Só me resta agora lembrar de você, amor, ao som de Tim Maia!

Não sei porque você se foi
Quantas saudades eu senti
E de tristezas vou viver
E aquele adeus não pude dar…

Nessa vida malograda que tenho levado, tento de alguma maneira sobreviver, vivendo com essa saudade que me toma por companheira.

E na voz da Tânia Mara, então, preparem o lencinho!

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Tags:, , , , , Last modified: 5 de maio de 2019

Paula Jones (Paula Cincurá) é turismóloga de formação e atualmente cursa pedagogia. Trabalha como professora de Educação Infantil em Itaberaba, na BA. Nos tempos livres gosta de ler, ouvir música e não dispensa um chocolate (acredita no poder terapêutico que ele tem contra o estresse). Instagram @paulasallescincura